A valorização da agricultura familiar

A valorização da agricultura familiar

SENADOR CONFÚCIO MOURA (MDB/RO)
250ª Sessão Deliberativa Extraordinária da 56ª Legislatura
Plenário do Senado Federal
12/12/2019

O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB – RO. Para discursar.) – Hoje, no meu tema aqui, falo mais da Amazônia, sobre agricultura familiar; mas serve para Brasília, serve para Santa Catarina – que é tipicamente o Estado da agricultura familiar, um Estado do conhecimento – e para outros Estados. Então, nós vamos abordar aqui o tema da importância da agricultura familiar na Amazônia; mas é extensivo ao Nordeste, ao Centro-Oeste, ao Sudeste e ao Sul do Brasil.

O Brasil tem uma vasta população e uma enorme variedade de biomas, costumes e atividades econômicas. Temos mais de 500 regiões imediatas, como definidas pelo IBGE, a distinguir a geografia do nosso povo, cada uma delas com um potencial para ser explorado segundo suas próprias tradições.

Darcy Ribeiro chamou a Amazônia de jardim da Terra, reconhecendo a sua importância ecológica, mas também manifestando o desejo de explorar economicamente a floresta. Considerava que a exploração sustentável deveria dar para o seu povo, os seus herdeiros, um saber milenar.

Nas palavras de Darcy Ribeiro, “Não há por que plantar todas as árvores da Amazônia e criar todos os peixes amazônicos em São Paulo [é impossível plantar as mesmas árvores, específicas da Amazônia, todos os peixes da Amazônia, replicar isso tudo em São Paulo] ou em Minas [Gerais], como se faz, e não fazer o mesmo na Amazônia”.

Ele percebeu que, em cada localidade, a história da ocupação da terra pode ser contada de uma forma particular. No caso da Amazônia, a valorização da pequena agricultura e dos seus processos tradicionais seria fundamental para se produzir com qualidade e de modo sustentável. Aqui nesse quesito, agora, chegou ontem, foi publicada, a Medida Provisória 910, que trata da regularização fundiária do Brasil, tanto urbana quanto rural. Então, esse é um assunto que vai entrar mesmo no debate a partir de fevereiro, mas é de uma importância imensa para o Brasil – o Brasil ilegal, o Brasil sem documento, o Brasil desassistido. Então, essa medida provisória, depois de arrumada, poderá se transformar num importante documento de facilitação, desburocratização, documentação de terras públicas no Brasil.

Sempre considerei necessário o respeito à diversidade, em lugar de uma visão padronizada dos biomas brasileiros, pois o acesso à informação e aos bens de capital não é igual em toda parte. Isso é verdadeiro, pois o Pantanal tem uma realidade, a Amazônia tem outra realidade, o Cerrado tem outra realidade, a Caatinga tem outra realidade. Cada qual com a sua especificidade.

Eu cheguei em Rondônia, na década de 70, e desde então se tornou meu Estado por adoção – faz muito tempo –, e naquela época as cidades eram incipientes. Só havia duas cidades, que eram a cidade de Porto Velho e a cidade de Guajará-Mirim. Todas as demais eram vilas e distritos ou de Guajará ou de Porto Velho. Nesses quarenta e poucos anos, nós temos hoje 52 Municípios, organizados administrativamente, sem contar que hoje Rondônia é um Estado rico. Então, essas cidades desertas, de uma estrutura precária, foram dando lugar a um avanço das cidades mais modernas.

Eu aprendi, pela convivência com meus amigos pioneiros de uma região nova, a respeitar as diferenças entre as regiões, suas tradições. E, na realidade, Rondônia – que era, naquela época, tipicamente amazônica –, com a entrada de capixabas, mineiros, paulistas, sulistas, gaúchos e catarinenses, foi enriquecendo e hoje é complexa como o Paraná, levando conhecimentos novos ao caboclo amazônida. E o Estado de Rondônia virou um Estado mestiço do Brasil inteiro. É um apanhado do povo brasileiro amontoado lá.

Lá deve haver, Senador Amin, mais ou menos 9% de catarinenses. Nós temos cidades…

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB – RO) – Tudo. E o Valdir Raupp, que é de Santa Catarina.

O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP – SC. Fora do microfone.) – Ivo Cassol.

O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB – RO) – Cassol também.

Então, a cidade é composta de muita gente, é uma amostra do povo brasileiro. Lá há nordestinos. Na cidade em que eu moro mesmo, Ariquemes, grande parte dos habitantes são baianos, nordestinos. Em Espigão D’Oeste, por exemplo, há uma mistura de alemães – é uma cidade onde há muito alemão. São os pomeranos que vieram do Espírito Santo, de uma região da Alemanha, e que estão lá hoje. Eles têm ainda um programa de rádio em alemão – lá na cidade, há um programa de rádio na língua original. Por aí o senhor vê, Senador Reguffe, como é um Estado mestiço, misturado, como Brasília o é. Em Brasília também foi assim. Brasília é a mistura de tudo. Meu pai era piauiense e veio para Brasília. Moramos aqui na Vila Planalto. Então, Brasília é também uma amostragem… Hoje já há o filho, o nativo brasiliense, que deve estar com 60 anos, 55 anos, os mais antigos, mas, até pouco tempo, não havia ninguém brasiliense. Eram todos forasteiros, de Minas, de Goiás, os candangos, os retirantes que vieram construir o Palácio, este Congresso Nacional.

Na agricultura familiar na Amazônia, como no Nordeste, havia uma tradição velha, muito antiga, das queimadas. O agricultor pequeno daquela roça de coivara… V. Exa. se lembra bem disto, Izalci, de roça de coivara? Então, eles botavam fogo todo ano para limpar aquela coivara e matar carrapato, matar bicho, essas coisas todas – botavam fogo naquela rocinha. Então, foi passando, através do tempo, essa tradição. Hoje, é lógico, não é possível, por exemplo, fazer só uma agricultura paranaense, uma agricultura gaúcha, uma agricultura mato-grossense, que é toda mecanizada. Na pequena propriedade rural, não dá para fazer uma mecanização, porque os agricultores não têm dinheiro, não têm recurso para comprar adubo. Então, eles vão se ajeitando. Nas roças, uma hora se planta mandioca aqui, outra hora se planta milho acolá, outra hora se planta feijão ali. Aquilo vai rodando para que a fertilidade não acabe. Então, há essa tradição do fogo na pequena propriedade, mas isso não pode ser objeto… Não é o grande fogo, não são as grandes queimadas que realmente causaram impacto internacional; é aquele fogo pequeno no quintal aqui, acolá. Mas, por isso, nós não podemos castigar a agricultura familiar da Amazônia.

Infelizmente, contudo, criou-se uma política de criminalização do pequeno produtor, como se as queimadas de 2019 apresentassem algum dado novo em relação aos outros anos.

Esse tema, Sr. Presidente, que eu estou falando aqui agora não é meu, não, não é de minha autoria, não. Esse tema é de autoria do pesquisador da Embrapa, Dr. Evaristo de Miranda, que publicou um artigo chamado “Amazônia: A Pior das Extinções”, publicado no dia 4 de novembro no jornal O Estado de S. Paulo, no qual o autor fez uma justa defesa dos pequenos agricultores da Amazônia.

É fundamental a gente manter a tradição da agricultura familiar. Eu fico muito preocupado, porque hoje a gente olha muito para o agro: o agro é tech, o agro é isso, o agro é aquilo. Na verdade, é muito bom. A gente exporta muita soja, muito algodão. Hoje mesmo houve aqui uma sessão especial em homenagem à Associação Brasileira dos Produtores de Algodão.

Mas nós temos também que fazer sessões especiais para prestigiar os agricultores familiares.

O Esperidião está aqui. Ele vai falar daqui a pouco. Santa Catarina é o Estado da agricultura familiar, das pequenas glebas, das colônias que produzem queijo, produzem vinho, produzem até o turismo rural, produzem carne suína, frangos, há as cooperativas que têm conglomerados, fornecedores por perto. E ela cresceu assim. Hoje há cidades industriais, como Florianópolis e Joinville; e outras são players de tecnologia e inovação, como não há no Brasil, e fazem a coisa bonita. Mas a base e o fundamento de Santa Catarina é a agricultura familiar, gente.

Então, nós não podemos de maneira nenhuma deixar de prestigiar a agricultura familiar. Ela é essencial, ela é importante. O pessoal pensa que agricultura familiar é de pobre, que a agricultura familiar é de esquerda, que a agricultura familiar é de nada. Mas o agricultor familiar é um trabalhador de sol a sol. Então, isso é importante. E Evaristo de Miranda, da Embrapa, prova isso. Isso é muito importante.

Sr. Presidente, entre os produtores da Amazônia e do Brasil, 89% são pequenos – são pequenos.

Aqui, no GDF, Izalci, a cidade-satélite de Brazlândia é produtora de morangos. Há pequenas chácaras produtoras de morangos – produzem morango aqui! A agricultura familiar de Brazlândia produz morango para atender Brasília e ainda manda uma parte para fora do Estado. Uma cidade-satélite aqui produz frutas maravilhosas para o Brasil. Por aí você pode ver a importância da agricultura familiar.

Então, Sr. Presidente, nós queremos é regularizar essas terras, documentar os pequenos, arrumar crédito para eles, cuidar dos filhos dos agricultores familiares, que estão com o celular nas mãos. Os meninos filhos ou netos dos agricultores originais não querem mais ficar na gleba, correm para a cidade.

Nós temos que criar mecanismos, Izalci, você que gosta desse tema da profissionalização, encontrar mecanismos de profissionalizar o menino cujos pai e mãe são agricultores familiares. Ele tem que voltar para a gleba levando conhecimento novo, levando o celular nas mãos para trabalhar na roça. Nós não podemos tirar o celular das mãos do menino. Nós não conseguimos tirar o celular das mãos do jovem. Ninguém tira, porque o celular é como o arroz e o feijão. Hoje ele faz parte da nossa vida e da nossa alma. Então, o menino tem que voltar para a roça com o celular, com a tecnologia, levando alguma coisa nova para a sua família.

Em razão disso, eu quero valorizar esse trabalho do pesquisador da Embrapa, o Evaristo, que fez esse trabalho lindo, publicou isso tudo, e valorizar as iniciativas de Santa Catarina, as iniciativas do Espírito Santo, que ainda tem muita agricultura familiar e tem a educação nas Escolas Família Agrícola, as escolas de comunidade, criadas na França. Nessas Escolas Família Agrícola, o pai leva o arroz, o feijão, a banha e leva o menino, que fica lá 15 dias. São escolas de alternância.

Ele aprende teoria e fica 15 dias, com o pai, colocando na prática – as escolas de alternância.

O Brasil é pobre. O Brasil precisa sair desse complexo de riqueza e voltar para suas origens, ensinar os meninos a trabalhar corretamente, produzir comida para o mercado interno, brasileiro, em abundância e barata, e muita.

É este, Sr. Presidente, o motivo do meu discurso de hoje: a valorização da agricultura familiar sustentável, preservando águas e nascentes, preservando solo, preservando floresta, preservando o clima; isso é indispensável. São essas as minhas palavras.

E muito obrigado, Sr. Presidente.

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