A desigualdade é uma bomba relógio

A desigualdade é uma bomba relógio

SENADOR CONFÚCIO MOURA (MDB/RO)
12ª Sessão Não Deliberativa da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura
Plenário do Senado Federal
21/02/2020

O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB – RO. Para discursar.) – Sr. Presidente, senhores funcionários do Senado, telespectadores, este meu pronunciamento de hoje tem como base e inspiração alguns artigos já publicados em jornais, principalmente a opinião do consórcio de Governadores do Sul e do Sudeste brasileiro, publicado na Folha de S.Paulo; um artigo da Maria Alice Setubal, também publicado na Folha; um do Paulo Rebêlo, também muito bem-feito, publicado no Estadão; e algumas opiniões minhas isoladas também fazem parte desse coro e fundamentam meu pronunciamento de hoje.

Eu também gostaria de, antes de iniciar, mandar um abraço para o Cid Gomes, que está convalescendo de um atentado. Esperamos que ele se recupere o mais rapidamente possível. Ficamos muito felizes por ele ter resistido a toda essa situação dramática que o País, consternado, viu de um confronto desnecessário.

O Brasil vive um momento de transformação: desafio da preservação da democracia. Precisamos de mais convergência, e, por isso, nosso País não pode caminhar dividido e desigual. Uma democracia pressupõe o espaço de diálogo, e os governantes, com suas reformas, não parecem estar preocupados com a redução da desigualdade, e isso deveria preocupar a todos nós.

Hoje nosso drama desenhado é, de fato, a imensa desigualdade existente em nosso País, que chega a humilhar a todos. É importante a gente se preocupar, porque a desigualdade é uma bomba-relógio que pode explodir a qualquer hora e deixar consequências desastrosas para ricos e para pobres. Como falei, a desigualdade humilha.

A sucessão de crises dos últimos anos levou a uma profunda redução do crédito em diversas fontes do País, associada ao baixo crescimento estrutural da economia, com Estados e Municípios com suas contas desequilibradas e sem perspectiva de ajuste nos próximos anos, além do desalento e da desigualdade social ampliada.

A desigualdade é injusta demais, porque promove a concentração da renda e cria imensos espaços e distâncias entre as pessoas, e ninguém neste País poderá ter orgulho de ser brasileiro quando se convive com a miséria absoluta ao lado.

Assim, quando os países enfrentam desigualdade maior, isso prejudica não só o desempenho econômico de todo o país, como também seus níveis de educação e de saúde.

O vocabulário é o de sempre, as frases de efeito são as mesmas: ajuste fiscal, reformas estruturais, ciclo de confiança, crédito, melhoria da qualidade da educação. Isto todo mundo sabe na teoria, mas agora chegou a hora de fazer efetivamente, de pôr a mão na massa, de deixar de conversa bonita e agir.

Estamos vendo alguns enfrentamentos no País, greves e mais greves, as corporações pressionando por melhores salários, quando muitos Estados estão quebrados, como, por exemplo, Minas Gerais infelizmente. Mesmo assim, a Assembleia Legislativa daquele Estado aprovou melhorias de salários para algumas categorias, sendo que esse mesmo Estado ainda não pagou o 13º salário dos seus funcionários. Ficamos sem entender. Quando é um momento de sacrifício de todos, acontece um precedente como esse, que pode ser capaz de deflagrar uma onda de desordem nacional.

Precisamos acelerar a retomada do crescimento econômico e a geração de empregos, que têm de ocorrer em bases sustentáveis, regionalmente equilibradas, social e ambientalmente justas. Vamos deixar os nossos empresários trabalharem, vamos deixar de atrapalhar quem produz. Será necessário, portanto, consolidar, no Brasil, um ambiente institucional e político estável, propício aos negócios e voltado ao aumento de produtividade, do nível de emprego e da competitividade da economia.

O Brasil está travado e tira do povo o dinheiro bom, que sai do bolso de famílias e empresas para alimentar o gasto federal, para pagar despesas obrigatórias, que não cabem mais na pesada carga tributária brasileira. No Orçamento da União, não cabem tantas despesas e, na soma geral, faltam recursos para investir no que precisa, principalmente na educação, na saúde, na segurança pública.

É um jogo de xadrez terrível conciliar os gastos obrigatórios, cada vez maiores, com os gastos discricionários, que são passíveis de cortes. O Governo é gestor de um orçamento 95% congelado por obrigatoriedades. O que sobra para cortar são os restantes 5% ou menos, que são justamente os gastos mais prementes e as despesas mais produtivas, pois representam os investimentos em infraestrutura, a conta de luz da universidade, a gaze no hospital, o lápis na escola.

É preciso que o Governo brasileiro tenha coragem de fazer as mudanças necessárias e enfrentar, com bons argumentos, os que sempre se beneficiam do dinheiro público. Vejam o exemplo dos Estados Unidos e da Alemanha, que tiveram coragem de promover ajustes fortes para destravar as suas economias em períodos após grandes recessões, mesmo colocando em risco as popularidades.

Eu fico satisfeito porque estou vendo que o Governo atual, o Governo Bolsonaro, já remeteu ao Congresso inúmeras reformas – são cinco ou seis em andamento –, que estão aqui para análise dos Parlamentares. Isso é extremamente importante, ou seja, a coragem que o Brasil deve ter para o enfrentamento necessário.

Mas por que o Estado brasileiro não produz o que é preciso? De que maneira se dá esse crescimento sustentável? Francamente, eu não sei a hora, não há de demorar, um trabalho rigoroso em cima da folha de salários, para todos os Poderes, para o estudo das inconsistências existentes; dar uma enxugada geral. Caso não seja suficiente, será necessário um corte linear de salários e outros gastos, porque, do jeito que está, o Brasil não precisa de Presidente, e, sim, de um gestor de recursos humanos.

Sr. Presidente, aqui eu falo por experiência própria. Lá no nosso Governo do Estado de Rondônia, junto com o Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público, nós contratamos, com o apoio de todos esses entes, a Fundação Getúlio Vargas para se debruçar sobre a folha de salário do Estado. De imediato, eles detectaram 14 inconsistências – 14 inconsistências –, que foram cortando. Deu até gente armada, lá no departamento de recursos humanos, onde se cuidava da folha, para agredir o chefe dos serviços e ameaçá-lo. Mas não ficaram só nessas 14 inconsistências lá no Estado; quando eu saí do Governo, já havia 45 inconsistências na folha de salário, pagando de uma maneira desnecessária e ilegal. Então, esse debruçamento minucioso sobre a folha de salário de toda a estrutura do Governo Federal e dos Governos estaduais, por si só, gera uma economia muito importante.

O Brasil é tudo. Todos os Poderes estão dentro do Orçamento Geral da União – todos os Poderes! Não há milagres. Chegou a hora de cair na real, parar com as construções de prédios desnecessários, palácios nababescos, obras reluzentes. Deixem isso para quem pode fazer – no caso, os Emirados Árabes, em Dubai, cidades chinesas, países que fizeram seus deveres de casa anteriormente – e terminem fundamentalmente as obras inacabadas. É vergonhoso ter tantas obras inacabadas. Ontem aqui, eu não lembro quem foi o Senador que abordou esse tema. Não sei se foi o Dário Berger ou outro colega, que apresentou as estatísticas das obras inacabadas no País. Realmente é uma situação vexatória para o País, fazer obras grandiosas atuais e deixar obras essenciais, como as creches. Há muitas creches inacabadas no Brasil.

Temos que envolver a sociedade civil organizada em busca de ações voltadas para a expansão das capacidades e geração de soluções novas – o Governo sozinho não dá conta –, dar atenção à primeira infância, à segurança pública, ao empreendedorismo inclusivo, ao desenvolvimento urbano, à democracia.

Então, que ações efetivas conjugar para fazer frente a essas e outras necessidades? Que agendas impulsionar para a requalificação da vida política e democrática do nosso País? Como atualizar os meios de ação coletiva entre a sociedade, empresas, universidades, setor público, para avanços comuns? Em tempo de desalento, a saída é buscar as referências inspiradoras. Ninguém inventa tudo; a gente copia muita coisa mais fácil, onde deu certo, traz para cá, através dos Estados, dos Municípios – isso é muito importante.

Para o Brasil próspero e consolidado em bases sólidas, é necessário retomada imediata dos investimentos em infraestrutura: pontes, estradas, ferrovias são necessárias para escoar a produção do Centro-Oeste, do Tocantins, de Rondônia, do Piauí, da Bahia. Toda essa produção sai no meio de transporte caro, que é meio rodoviário, realmente dispendioso.

É preciso chamar todo mundo para dentro do Brasil – todo mundo. Todo mundo é importante! Todos são importantes! Aceitar a participação da sociedade civil. Não tem essa de ficar o Governo sozinho. O Governo sozinho não existe, o que existe é o povo brasileiro, é o empresário, é o dono do hotel, o dono do bar, o dono do boteco, enfim, todo mundo que produz, que gera emprego, que contrata. Esse é o Brasil que a gente precisa chamar para dentro.

Também é oportuno agregar o conhecimento das pessoas atuantes nos meios comunitários. Há tanta experiência boa nas favelas, nos bairros pobres, há gente se virando, criando alternativa de sobrevivência com dignidade em suas comunidades.

As organizações nacionais civis. Como é que gente pode deixar de lado a estrutura das igrejas evangélicas, Igreja Católica, das comunidades todas, com uma Irmã Dulce, com uma Zilda Arns, enfim, essas pessoas benfeitoras do Brasil, que trabalharam e deram um resultado incrível?

Eu, como médico, se me perguntarem – eu me formei em 1975, lá na UFG, de Goiás –, nesses quarenta e tantos anos, qual foi o maior feito da Medicina no Brasil, a gente pode pensar em uma cirurgia que abre o crânio, em uma cirurgia que faz um transplante de coração, em um transplante de fígado; tudo isso é importante, mas para mim foi o soro caseiro. O soro caseiro e a multimistura, que a Zilda Arns fez com a Pastoral da Igreja Católica, subindo morros com voluntários.

Olha, Senador Kajuru, quando eu iniciei minha profissão lá, em Rondônia, pegava umas crianças desnutridas que eram difíceis de se recuperar, crianças desidratadas, que eram difíceis de se recuperar. No decorrer do tempo, com a pastoral, com o soro caseiro – tão simples: um litro de água e uma colherzinha de sal e açúcar –, oferecendo à criança com diarreia e vômitos, nós passamos a não ter essas desidratações tão graves, essa mortalidade infantil que era altíssima no Nordeste e no Norte brasileiro e que hoje se reduziu a níveis aceitáveis – apesar de ainda altos, nós podemos reduzir ainda mais. Foi a Zilda Arns, com seu trabalho, que promoveu isso no Brasil. Como é que a gente pode deixar esse povo de lado? Como é que eu posso falar que esses brasileiros não servem para ajudar o Brasil? Isso é uma falta de bom senso! Nós temos que abraçar todos. Venha, Brasil! Venham todos ajudar o nosso País de braços abertos, com suas experiências, com suas participações ativas, voluntárias, sem remuneração – muitas delas fazem assim.

A mudança para melhor dependerá da nossa capacidade de integrar o aprimoramento da democracia, reduzir a desigualdade, combater a mudança do clima, temas-chaves do mundo contemporâneo. A transformação é possível porque há conhecimento e há tecnologia. O problema, entretanto, é mais político do que técnico, é mais analógico do que digital. Dependemos de decisões tomadas a partir das relações políticas e sociais.

O que é importante fazer para melhorar a situação do Brasil? O que é importante? As grandes reformas são importantes? São importantes! A reforma tributária é importante? É importante! Tudo é importante, mas não somente elas, não somente elas, nós precisamos também das pequenas e médias reformas. Precisamos das mudanças de comportamento das pessoas, da formação profissional dos jovens, da abertura comercial do nosso País, deixar de ser tão fechado e tão protecionista.

Enfim, temos que entender que o Brasil não é só uma pessoa, o Presidente, responsável por tudo, mas todos nós; não só os Ministros, mas todos nós, todas as entidades, todos os cidadãos brasileiros assumirem atitudes positivas.

Sr. Presidente, vou saltar aqui uma página para fazer o fechamento.

Nunca é demais lembrar que foi com essa amplitude, com essa vitalidade social, que geramos todos os avanços acumulados até aqui. Não é o que a gente esperava, hoje, ser assim economicamente, educacionalmente, enfim, os índices de violência, não era o que nós esperávamos chegar hoje, e também a falta de dinheiro para investimento, mas chegamos, demos uma melhorada no cenário das cidades. Movidos por essas experiências, identificamos e trouxemos à tona os limites desses avanços. Nós estamos no limite desses avanços a cada momento. Somente com elas podemos encontrar os caminhos para superar esses limites ruins do atraso, da politicagem, das atitudes não republicanas. Nós tomamos um rumo do desenvolvimento econômico e social da sociedade que precisamos ter e que podemos ser.

Eu, como sempre aqui, falo com muita frequência na educação. Eu sei que é importante tudo isso, mas, nas grandes reformas que estão aqui hoje – há as comissões para debater –, se a gente não trabalhar efetivamente a melhoria da educação do Brasil, a gente não consegue esse crescimento sustentável, esse desenvolvimento bacana. Não basta ter muito dinheiro, muito recurso, melhorar tudo, se o pessoal não está preparado para o trabalho. É muito difícil os jovens serem chamados para dentro, para o primeiro emprego, para trabalhar logo. Os índices de desemprego dos jovens até 25 anos é brutal no Brasil. Eu nem sei a estatística exata, mas é muito grande.

Então, a gente precisa movimentar o nosso País, do nosso jeito…

(Soa a campainha.)

O SR. CONFÚCIO MOURA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB – RO) – … mas temos que ter, antes de tudo, essa criatividade, esse espírito de abertura, essa aceitação de todos.

Assim, Sr. Presidente, como só somos nós dois hoje, aqui no Plenário, eu estou encerrando o meu discurso, saudando o povo brasileiro, saudando todos aqueles que gostam de Carnaval, que vão para se divertir bastante. Carnaval é muito bonito, é uma festa nacional. É multiplicada para o mundo todo, como a cara do Brasil. Atrai muito turista, movimenta muito dinheiro. Os músicos trabalhando, os grandes cantores, as costureiras, os que promovem as escolas de samba, com sua criatividade, a sua elegância. Cada ano superando o outro ano. É coisa rara, preciosa. É um encanto.

Mesmo quem não gosta de ir para o samba, ir para a folia, ele fica em casa na televisão, ele gosta de ver a beleza de tudo aquilo, aquele ritmo, aquela escala de tempo dos desfiles em São Paulo, aquele desfile lá em Recife. Lá em Salvador, o povo atrás do trio elétrico. Ivete Sangalo cantando, é Gilberto Gil, é Caetano, são os sambistas anônimos, é o povo brasileiro festejando. Essa manifestação é de felicidade.

Agora falta nós fazermos a nossa parte para amparar, realmente, esse povo alegre, esse povo bonito, esse povo festeiro do Brasil, que precisa de nós todos, especialmente do Senado, da Câmara dos Deputados, dos Ministros da República, dos Prefeitos queridos, dos Governadores brasileiros.

Era só, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

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