O SERTANEJO NA CIDADE GRANDE 2

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O SERTANEJO NA CIDADE GRANDE 2

Os primeiros dias foram de reconhecimento da cidade. Saí cedo do Bairro Popular e meti a cara na rua. Aquele tempo não havia concurso público, era um currículo ou uma prova simples e pronto. Meu sonho era trabalhar no Banco do Brasil. Não tinha escolha, pegaria a primeira oportunidade. O meu dinheiro só daria para as despesas de trinta dias. Bar do João ali perto, na esquina da Rua 73, onde descobri meu sonho de consumo: o pudim. Nunca tinha visto um pudim na minha vida. O pudim de padaria. Pudim duro, feito com sobra de pão e outras coisas. Uma delícia. Não sabia como comer pudim. Ele me explicou, que seria de pedaço em pedaço. Pedi dois, mais dois. Achei o máximo das delícias do mundo. Não conhecia “fanta”, nem “grapette” e nem coca-cola. Meu Deus, estava no mundo dos encantos culinários e das bebidas dos deuses. Tudo muito gostoso.

Não poderia gastar “meus trocos” só com pudim, coca e grapette. Tinha que economizar para o almoço e o pão-com-manteiga da noite. E era só. A primeira chance de emprego que me surgiu foi um teste da Polícia Militar. Não pensei duas vezes, fiz e passei para a escola de sargento. Um ano de dureza, comer pouco e correr muito. Fiquei couro e osso.  Mas, mesmo assim, matriculei no Liceu de Goiânia, tradicional escola de ensino médio do Estado e segui em frente. Todo dia um ou dois pedaços de pudim. Fiquei louco por este doce. Nem se compara com a delícia que é o pudim de hoje, macio, molengo, com mel e cobertura. Não, o meu pudim, era duro e sem cobertura de nada.

Tinha uma namorada do interior, que estava em Goiânia. Não vou falar o nome dela. Fui apaixonado de  morrer, foi neste tempo que fiz as primeiras poesias de amor.  Eu aluno do curso de sargento, secundarista do Liceu, salário pequeno, portanto, um cara sem futuro. Ela um ano mais velha, linda e maravilhosa, disputada no mercado, logo começou a namorar com o Capitão da PM. Eu aluno, um coitado, blefado.  Ela fez muito bem. Mas, não tinha coragem de terminar o namoro. Eu “Caxias” pra caramba, só queria estudar, ia à casa dela correndo aos sábados. E não deu outra. Perdi a namorada. Por outro lado, tirei primeiro lugar no curso, passei para o Colégio Universitário, dentro da Universidade Federal, para o terceirão. Eu me virava que nem um condenado, o foco era o curso de medicina. Sem pensar em namorada, sobrou mais tempo para estudar. Fiz o vestibular, sem cursinho, passei em Goiânia para medicina e em Brasília, na UNB para Geologia. Não tive dúvidas, optei pela medicina e consegui ficar no IML os seis anos do curso, e o meu serviço era auxiliar de necropsia. Fiquei craque em cuidar de defunto. Pegar o corpo no local do acidente, ajudar na necropsia, costurar, lavar e vestir. Até hoje eu visto um cadáver sozinho entre cinco e dez minutos.

E sabe como é que é! Ainda arrumava um tempinho para umas paqueras aos domingos na Praça Cívica de Goiânia. Ah! tempo bom, que não volta mais. É como diz Euclides da Cunha – o sertanejo é antes de tudo um forte.

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