Confúcio Moura traça panorama profundo da pobreza brasileira e diz que só a educação de qualidade resolve

Confúcio Moura traça panorama profundo da pobreza brasileira e diz que só a educação de qualidade resolve

Na avaliação do senador, é hora de esquecer que o Brasil é o país do futuro e transformá-lo no país do agora, do hoje – e isso é absolutamente possível

Em discurso  nessa segunda-feira , 22, na Tribuna do Senado Federal, o senador Confúcio Moura (MDB-RO) descreveu um amplo panorama da pobreza no Brasil e conclamou a sociedade e os governos a darem um basta à tal situação. Com o simbólico título de “Vida Real no Futuro que não Chega”, o senador de Rondônia criticou a não continuidade de bons programas e a dificuldade que os gestores têm de replicar experiências exitosas de outros lugares.

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Tenho estudado, ao longo da minha vida, alguns pesquisadores, economistas, antropólogos, sociólogos, sobre a economia no mundo, principalmente a economia invisível, a economia não medida, que nós chamamos de economia subterrânea. Este tema “economia subterrânea” é título de um livro de um economista peruano chamado Hernando de Soto. Ele escreveu sobre as dificuldades que a pobreza enfrenta na área do trabalho, da habitação e da posse das terras. Segundo ele, desde que uma família ocupa uma área devoluta ou uma área da própria União, demora, mais ou menos, cerca de 15 a 20 anos para que essa documentação e a legalização sejam feitas. Imagine os limites que são impostos a essa família ao longo desse tempo”, afirmou o parlamentar.
Se esta é uma realidade no campo, nas cidades as disputas são ainda maiores, uma vez que os espaços são restritos e a concorrência maior. “Vocês podem imaginar a disputa por um metro quadrado de calçada para os camelôs das avenidas mais movimentadas do país? Aqui mesmo em Brasília, próximo à rodoviária. Ali estão colocados os trabalhadores informais a venderem suas coisas para quem passa. E sempre, sempre, a polícia ou mesmo os órgãos repressores do GDF vão lá e espalham aquela gente toda na operação chamada de ‘rapa’ que, aliás, é uma prática que remete aos tempos da ditadura”, lembrou o senador.

Segundo o senador, além de Soto, o economista Celso Furtado foi um estudioso das causas da pobreza no Brasil. “O trabalho subterrâneo existe. E ele foi estudado muito bem aqui por Celso Furtado, nos anos 50, um grande economista brasileiro, exilado na França, que estudou muito, escreveu muitos livros. Foi o fundador da Sudene e de outras instituições para combater a desigualdade social e econômica do Brasil, principalmente do Nordeste brasileiro”, informou.

Para Confúcio Moura, a democracia é uma conquista importante para todos, mas a sua permanência depende da forma como distribui os ganhos e para quem. “Se quisermos que a democracia tenha vida longa, precisamos chamar para dentro dela camadas sociais que são hoje excluídas. A democracia inclusiva é a solução: ou ela se retroalimenta, inclui, ou os rejeitados a derrubarão”, alerta o senador.

Para o parlamentar, a democracia brasileira fez uma parte do seu papel, que foi oferecer oportunidades a todos. Mas, não criou as condições para que todos pudessem acessá-las. “Há inúmeras barreiras para que uma pessoa que nasce e vive num bairro periférico possa mudar de patamar social. É muita dificuldade para que um filho de uma empregada doméstica, de um trabalhador braçal, de um porteiro da noite e outros tantos possam prosperar e crescer, a não ser com um gigantesco esforço pessoal, intelectual, de dedicação, bem acima dos seus próprios limites. Há barreiras extraordinárias ao crescimento das pessoas. Há falta de oportunidade para estes”, disse Confúcio.

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Na avaliação do parlamentar, a falta de continuidade de bons programas e projetos é um dos limites que os gestores precisam superar – Mesmo que mudem de nome, de logomarca. “Muitos programas de governo são excelentes, criados por Presidentes, Governadores ou Prefeitos. Por exemplo, esse programa, hoje chamado Bolsa Família não é de autoria do Lula, não é de autoria do Fernando Henrique, não! Ele surgiu na cidade de Campinas, lá no interior de São Paulo, com um Prefeito que foi o primeiro Prefeito do Brasil a dar dinheiro a uma criança de rua para ela ir para a escola. Depois foi evoluindo e hoje é o chamado Bolsa Família. Portanto não há necessidade de um governo desfazer coisas boas de outro governo. É importante dar seguimento aos bons projetos. Por exemplo, as experiências educacionais bem-sucedidas em muitas cidades brasileiras e até mesmo em estados podem e devem ser imitadas, copiadas e continuadas”, sugeriu o senador.

As mudanças tecnológicas e do modo de produção capitalista é uma realidade, afirmou Confúcio Moura. No entanto, ela acabou com as vagas de emprego, mas não acabou com os trabalhadores e sua necessidade de sobrevivência. Ao contrário, deixou aos estados nacionais a responsabilidade de cuidar dos “rejeitados pelo mercado”. “Hoje temos cerca de 40 milhões de informais no Brasil. Eles são trabalhadores para garantir o sustento do hoje, do agora; eles não são trabalhadores para o desenvolvimento do país; eles são sobreviventes, trabalham para o almoço e tentam garantir a janta. Onde estão eles? Estão na rua! Eles estão nas feiras; eles estão nas calçadas, como camelôs”, disse o parlamentar.

Para o senador, já existem modelos exitosos de apoio ao empreendedorismo comunitário, de baixo custo, grande alcance e focalização nos que mais precisam. “O microcrédito Solidário, o crédito para os pequenos. A exclusão bancária no Brasil é evidente. Tem muita gente que nunca entrou num banco, e outra grande quantidade de pessoas só vai ao banco com o cartão para o saque do seu benefício mensal. Enfim, nós temos que ampliar o crédito solidário, para emprestar o dinheiro sem um aval. Quem é o avalista dele? É o vizinho. Vá lá o agente de crédito e pergunte àquele vizinho, de um lado e do outro, quem é aquele fulano que está lá batendo no banco do povo querendo R$ 2 mil, querendo R$ 1 mil. É o vizinho que vai falar: ‘Ela mora aqui mesmo. Mora há dez anos, é gente séria, trabalhadora”’, afirmou Confúcio Moura.

Então, nós devemos enfrentar nossos problemas logo. Não temos que ficar esperando mais 40 anos, mais 10 anos, mais 20 anos, mais décadas perdidas sucessivamente. O Brasil não cresce, meus amigos! Há 40 anos o Brasil não experimenta um crescimento sólido e definitivo. O Brasil é oscilante, entre o zero de crescimento e 1%; quando chega a 2%, nós comemoramos; quando bate 1,5%, a gente já fica alegre. É assim que a nossa economia oscila.

Dando continuidade ao discurso, Confúcio fez um apelo. “Então, nós deveremos enfrentar nossos problemas com as nossas próprias mãos, com a realidade, com as dificuldades que cada um de nós tem na sua vivência. Não vamos acreditar que algum país do mundo vai mandar dinheiro para combater desmatamento na Amazônia. Isso é ilusão! O Fundo Amazônia é bom. Ele é bom, é importante, mas não vai resolver. Os nossos problemas nós temos que resolver. É ‘nós com nós mesmos’, trabalhando, expandindo as nossas relações comerciais com o mundo, desde que mantendo a nossa soberania, potencializando aquilo em que nós somos bons, que é o agronegócio – sem desprezar os pequenos produtores rurais e a agricultura familiar, claro. Nossas soluções, nossos problemas estão em nossas mãos”.

Ao concluir sua fala, Confúcio Moura chamou a atenção para a forma como a sociedade se organiza para superar as dificuldades do doa a dia. “As favelas estão dando exemplo de organização da sua economia, da solução dos seus problemas. Nós devemos, se quisermos ser um país justo, levar para as periferias o que há de melhor. A melhor escola deve ir para a periferia; a melhor biblioteca tem que ir para a periferia, para os bairros pobres; as melhores quadras esportivas, os bons teatros nas periferias. Levar grandeza, beleza, equipamentos culturais, levar o esporte para as periferias brasileiras, dar mais a quem tem menos: é isso que nós devemos fazer e logo. Não dá para ficar adiando. Desde sempre falamos: ‘O Brasil é um país do futuro’. Até quando nós vamos ficar falando que o Brasil é o país do futuro? O Brasil tem que ser o país do agora, o país do presente, do hoje. Como é que nós fazemos isso? Oferecendo educação de qualidade para todos os brasileiros, promovendo um choque de gestão, fazendo o que deve ser feito”, concluiu o senador.

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