Mirante da Serra é um município que mistura, muito bem, o fisionomia do branco, negro, mestiço e o índio. Bem perto está a Reserva Indígena dos Uru Eu Wau Wau, que é enorme e fantástica. Por cima se viaja muito tempo só se vendo o verde, os píncaros e ondulações da Serra do Pacaás Novos. Local milagroso e um aquífero impressionante. Pois deste ponto nascem maioria dos rios do Estado. Por lá se encontra uma vegetação de tabocais, leguminosas gigantes, uma floresta mais rala, entremeio de floresta amazônica e savana. E majestoso voa naquelas lonjuras e alturas, o gavião real, espécie rara no mundo. Mas, o assunto de hoje, não se destina a falar de flora e nem de fauna na Reserva dos Urus, mas, para falar da labuta de um prefeito de cidade pequena, com um torpor mental, que não se combina com a natureza plácida que envolve o rincão mirantense.
Vocês vão me entender, porque não devo colocar o nome das pessoas a luz do dia. De um lado está um líder local, bem popular, religioso, pai devoto, família enorme e do outro lado, o revés da política, o contraditório, a intriga e mais à frente a letra da lei. O Prefeito de Mirante em outros tempos era o Mister M. O Vereador que lhe fazia oposição sanguinária Mister K. Pois bem, o mandato ia andando, e, sempre a saúde pública era e ainda é o grande problema dos prefeitos de todas as cidades brasileiras. Foi assim, como de costume, Mister M descia a avenida principal, cumprimentando um e outro, quando surge, para seu desconforto, o diretor do hospital. A falta de remédio no estoque. Coisa pouca, mas, estava em falta. E para remediar precisava , com urgência de uns produtos essenciais. E nesta hora, só o prefeito para resolver. Sem alternativa, ali mesmo, no meio da rua, mandou pegar na farmácia da esquina e que depois a prefeitura pagaria, até bilhete Mister M mandou. O total da compra foi de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta reais).
Mister K não perdeu oportunidade, ficou sabendo, pelas ondas da rádio fuxico e o denunciou na promotoria. E por estas e outras medidas, por completo desconhecimento de princípios legais, porque é sempre assim, o líder popular, nada entende da coisa pública e entra, na disputa política, até sem saber o por quê, mas, entra. E assim, iniciou o calvário de Mister M, com saídas e retornos do cargo, até que no ultimo afastamento, exaurido de tanta chateação, enfraquecido dos nervos, saiu à noite, sem aviso, pela rodovia afora, sendo encontrado depois de quarenta e oito horas, palmilhando o caminho que nem ele mesmo sabia para onde iria. E foi andando. Depois de muita conversa da família ele resolveu se refugiar em sua chácara, que de conformidade com os boatos, o homem tinha ficado milionário, fazendas e muito gado, estas coisas de cidades pequenas e das grandes também. Fui avisado da situação e Mister M já tinha sentença favorável e que poderia voltar ao cargo. Mas, não queria mais. Estava consumido pela chateação e um estado de nervos, tonturas, falta de sono e muita raiva. Como religioso, engolia tudo, em nome de Deus. Mas, mesmo assim, estava fora de controle. E lá fui chamado, para o papel de conselheiro, junto com o Prefeito de Urupá, um Senador do nosso partido, fomos à sua “fazenda”, porque este era destino do seu exílio espontâneo.
Uma estradinha estreita, que nem aquelas que levam as aldeias, tortuosa e sombria fomos seguindo num jipe, para o encontro com Mister M. Ali estava o homem, derrubado, numa rede, nem se levantou para nos receber, movido por desilusão e muita tristeza.Queria sumir da vida. Ainda havia cinza e tocos queimando, chacrinha de dois hectares, cinco pés de mamões esparramados numa capoeira próxima, não mais que mil mudas de café plantado vicejando, um barraco sem paredes, coberto de palha, uma rede esticada, alguns tocos para se sentar. Era esta a fazenda do Prefeito. E nada mais. Debulhamos conversas, prometemos apoios e saímos sem a certeza do seu retorno à prefeitura. Pelo menos saímos com ele sorrindo, contando alguns casos e dois dias depois reassumiu o mandato.
Por assim comparar, do passado e do presente, a situação dos homens simples das cidades médias e pequenas, são tangidos para estes cargos por influência dos outros, mais ou menos, encaminham-se para um corredor de imprevistos, que nem o maior dos adivinhos pode imaginar seus destinos. Mister M acabou, bem mais tarde, condenado pela justiça, cumpriu pena, perdeu a aposentadoria, que mais tarde a recuperou num degrau superior da justiça, mudou de cidade, para nunca mais ouvir falar de política. Este é o glorioso caminho que segue muita gente, de alegria imensa quando se ganha a eleição e de outra alegria ainda maior quando se deixa o cargo.
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