Maria Quimas

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Maria Quimas

Ah! Maria Quimas, você é demais. Não me esqueço do seu gesto. por isso você se destaca  como símbolo de um povo que ainda não existe. Você é pureza das coisas. É a orquídea    entre as pétalas de bromélia luxuriante no meio das cascas e folhas mortas.

Foi assim- ela e o marido desciam a avenida Tancredo Neves, em Ariquemes,  olharam para a calçada e nem acreditaram. Seis mil reais em dinheiro e cheques. Olharam para os lados e pegaram o dinheiro, mas o dinheiro inchou em suas consciências. Contaram as cédulas, viram os cheques e havia um deles nominal ao Hospital São Francisco.

Não teve aviso em rádio, nem aviso de perdidos e achados, uma semana se passou. Começou a via-sacra para encontrar o dono. Iniciou pelo cheque nominal. Tentou falar com o médico do Hospital São Francisco: Queria conversar. Sempre ocupado. Quatro tentativas,  em vão. O dinheiro guardado.

Ela, simples merendeira. Sempre às turras com a necessidade e a escassez. Ele vive de “bicos”. E o dinheiro ali. Muito, para o mundo de suas realidades. Ficou guardado, debaixo do colchão. Ninguém sabia. Ninguém procurou. Mais uma tentativa de conversar. Nada. Apenas conversar, para explicar e devolver o que não lhe pertencia. O médico não teve tempo pra ela.

Trinta dias e nada. Ela me ligou em casa. Eu vivia no mundo das viagens para Brasília. Mas, queria me encontrar.  Queria conversar comigo sobre dinheiro. Fiquei assustado. Conversar sobre o que, mulher?

Bem verdade, conheço Maria Quimas há anos. Foi minha cliente no exercício da minha profissão. Então, fui à casa dela no setor 9. Ela me explicou tudo e me devolveu o dinheiro. Entreguei lhe a recompensa, que ela não concordava. Com muita insistência aceitou duzentos reais.

Quando entreguei o dinheiro e cheques à administração do hospital, a moça do financeiro ficou pálida. Nem precisa dizer, que não havia registrado nada na contabilidade. E os médicos ocupados, como sempre, nem perceberam a falta do depósito.

Maria Quimas, você é demais.

Neste mar de lamas que navega o país,  você é exemplo vivo da ética, seu gesto é um livro. Nem precisa filosofar, nem dizer nada das boas ações, porque é a ave canora, esta que canta a melodia forte do silêncio. Pois veja – o silêncio que canta. E que força tem a sua atitude. E que grandeza tem o seu gesto?  É o conflito entre o querer e o não querer. É a tentação que invade e a imensa capacidade de resistir. Tudo isso é grande demais. Tudo isso é bonito demais. É Belo!

Mulher, Maria Quimas, é em você que me inspiro. Nas minhas madrugadas silenciosas, olho para o céu chumbo e vejo nele bem longe uma estrela que pisca para mim, ela pisca  e me encanto, é você  inteira – Quimas, sublime e eterna.

Nem tudo está perdido. Atitude como esta é que nos anima a dizer que o homem é bom. Que a maioria das pessoas quer acertar. Que há muita gente bem criada e que prefere viver em paz ao conflito de consciência. O conflito sempre existiu, cada um pode seguir o caminho que quiser, o da direita ou da esquerda e isto movimenta a vida  sempre.

 

* Escrevi esse texto há mais de 15 anos e continua atual.

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